faz mais de dez anos que tento viver de literatura. só falta combinar com leitores o suficiente pra bancar esse luxo, tarefa inglória. porém uma boa base eu tenho, e se você assina essa newsletter saiba que é cúmplice disso. eu só agradeço, especialmente se estiver no time de 105 pagantes entre mais de 50000 assinantes.
se colocarmos na conta o tempo utilizado pra produzir um livro - média de dois anos - e as viagens pagas do meu próprio bolso pra promovê-lo tecnicamente pago pra trabalhar.
tudo isso pra NÃO ter os livros nas gôndolas de grandes livrarias, já que a editora é pequena e o sistema de distribuição tem preferência por outros estilos de literatura. felizmente tenho alguns parceiros (livraria simples em são paulo, casa da árvore no rio de janeiro e jenipapo em belo horizonte) que não me deixam cair totalmente no anonimato.
e ainda tenho os meus eventos gastronômicos, onde posso oferecer os meus títulos de mão em mão, tal como plínio marcos.
no meu último livro estão as minhas letras mais bem resolvidas e cheguei a pensar que furaria a nossa bolha.
me enganei e o sopro de otimismo passou.
mas aí tive a ideia de mais um livro. em princípio o escreveria apenas pelo processo que tanto gosto, mas decidi publicá-lo.
por mim e também por você, que me prestigia há tanto tempo. só por isso já vale.
será um guia fantástico de lugares que já fecharam na cidade de são paulo. tem bares, cafés, restaurantes e outras coisas. estou me divertindo adoidado com a atividade. só terá espeluncas que eu conheci, esse é o critério. acho que devo esse resgate de memória à cidade que tanto me dá, mesmo que as oferendas às vezes se apresentem em forma de cilada, bino.
como minha foto de autor anda desatualizada, o alê boechat - que tá cuidando da direção artística do livro - teve a ideia de me fotografar de frente pro túmulo onde meu pai ta enterrado, no cemitério da lapa.
como a feira do pacaembu ficava no meio do caminho, achamos boa ideia uma parada pra comprar um pastel pra levar pra sessão. me surpreendi com a ausência de barracas na feira. agora é só pastel e caldo de cana. e ainda me dei mal com o pedido da bebida, maldita seja a hora em que troquei o tradicional limão - que equilibra o dulçor da cana - por um xarope nojento de cupuaçu.
eu não entrava no cemitério desde o enterro da minha mãe, morta em 11 de novembro de 2011 e pouca coisa mudou desde então. velório bombando, banheiro meio sujo, sem copo pra beber água do bebedouro, cheiro de terra. o lapeano médio sabe dar os seus pulos quando temos que enterrar um dos nossos.
não me lembrava bem onde ficava o túmulo, mas após umas três voltas e quatro cambalhotas no estilo kung fu panda gira o achei.
para a minha surpresa trocaram o material de tom escuro da lápide por uma espécie de azulejo branco que me remeteu à tábua que a tia dirce usava pra abrir bala de coco. feio pra caralho.
deu foto boa, não. a crise é, acima de tudo, estética. e eu, o familiar mais ausente do pedaço, não sou ninguém pra reclamar. até porque o meu pai é meio que um intruso na lápide da família da minha mãe, que anda bem cheia. se não me falha a memória o primeiro enterro ali foi o do meu avô, morto em 15 de novembro de 1989. o velho era tão sangue ruim que primeiro foi no colégio votar no maluf e depois voltou pra morrer em casa, azarando assim o churrasco da família. mas notei a falta do seu nome na lápide, assim como despertou curiosidade o nome de alguém que simplesmente nunca ouvi falar como a última a ser enterrada no mausoléu. melhor não procurar desenrolar esse fio, creio eu.
como o salgado ainda estava na mão, aproveitei a ocasião e arrisquei duas mordidas, mas queijo bosta frio tem gosto de plástico. então enfiei o pastel no saco e fui embora.
prestigie os seus enquanto ainda estão vivos.
um amigo pegou um guia 4 Rodas de 1991 num sebo e marcou no Maps todos os estabelecimentos citados que ainda funcionam em SP:
https://www.google.com/maps/d/u/0/viewer?hl=en&mid=1rdk7v8jQQOl3W8gQk_rwxw78-cKD4ls&ll=-23.571278415830246%2C-46.6352179&z=13